sábado, 2 de abril de 2011

Carta do Ausente - Vinicius de Moraes

John William Waterhouse - Cymon and Iphegenia

Meus amigos, se durante meu recesso virem por acaso passar a minha amada, peçam silêncio geral. Depois apontem para o infinito. Ela deve ir como uma sonâmbula, envolta numa aura de tristeza, pois seus olhos só verão a minha ausência. Ela deve estar cega de tudo o que seja o meu amor (esse indizível amor que vive trancado em mim num cárcere mirando em pós seu rastro). Se for a tarde, comprem e desfolhem rosas à sua melancólica passagem, e se puderem entoem cantus-primus. Que cesse totalmente o tráfego e silencie as buzinas de modo que se ouça longamente o ruído de seus passos. Ah, meus amigos ponham as mãos em prece e roguem, não importa a que ser ou divindade por que bem haja a minha grande amada durante o meu recesso, pois sua vida é minha vida, sua morte a minha morte. Sendo possível soltem pombas brancas em quantidade suficiente para que se faça em torno a suave penumbra que lhe apraz. Se houver por perto um hi-fi, coloquem o "Noturno em sí bemol" de Chopin. E se porventura ela se puser a chorar, oh recolham-lhe as lágrimas em pequenos frascos de opalina a me serem mandados regularmente pela mala diplomática. Meus amigos, meus irmãos (e todos os que amam a minha poesia), se por acaso virem passar a minha amada salmodiem versos meus. Ela estará sobre uma nuvem envolta numa aura de tristeza o coração em luz transverberado. Ela é aquela que eu não pensava mais possível, nascida do meu desespero de não encontrá-la. Ela é aquela por quem caminham as minhas pernas e para quem foram feitos os meus braços. Ela é aquela que eu amo no meu tempo e que amarei na minha eternidade - a amada una e impretérita. Por isso procedam com discrição mas eficiência: que ela não sinta o seu caminho, e que este, ademais ofereça a maior segurança. Seria sem dúvida de grande acerto não se locomovesse ela de todo, de maneira a evitar os perigos inerentes às leis da gravidade e do momentum dos corpos, e principalmente aquele devidos à falibilidade dos reflexos humanos. Sim, seria extremamente preferível se mantivesse ela reclusa em andar térreo e intramuros num ambiente azul de paz e música; Oh, que ela evite sobretudo dirigir à noite e estar sujeita aos imprevistos da loucura dos tempos. Que ela se proteja, a minha amada contra os males terríveis desta ausência com música e equanil. Que ela pense, agora e sempre em mim que longe dela ando vagando pelos jardins noturnos da paixão e da melancolia. Que ela se defenda, a minha amiga contra tudo que anda, voa, corre e nada; e que se lembre que devemos nos encontrar, e para tanto é preciso que estejamos íntegros, e acontece que os perigos são máximos, e o amor de repente de tão grande tornou tudo frágil, extremamente, extremamente frágil.

terça-feira, 15 de março de 2011

Certo dia, por lembrar-te lacrimosa, pensei nas estrelas.

Toda noite, quando entrego-me ao céu, deleito-me diante de tão pleno fulgor... As estrelas, em mim, entornam a beleza do orvalho a qual se perdeu pelo alvorecer de antigamente... E esta comoção noturna, agora se assim prefere ser, só não me provoca mais tristeza, porque certo dia, deparei-me às lágrimas entornando aos olhos teus... Estes os quais luziam... Sim, luziam! Como que pintados sobre uma tela de cor azul profundo, e infinito...

segunda-feira, 7 de março de 2011


''Si tu viens, par exemple, à quatre heures de l'après-midi, dès trois heures je commencerai d'être heureux. Plus l'heure avancera, plus je me sentirai heureux. A quatre heures, déjà, je m'agiterai et m'inquiéterai ; je découvrirai le prix du bonheur ! Mais si tu viens n'importe quand, je ne saurai jamais à quelle heure m'habiller le coeur...''

(Trecho retirado do livro do Pequeno Príncipe, em francês, que ganhei da minha querida amiga Marcela).

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Apenas mais uma espera.

Ambos exasperados silenciosamente, fizeram das poucas palavras, meras quebras de uma linha descontínua de um silêncio assustador. Era tanto para se dizer, era tanto para se falar - antes do não, antes do sim. Antes do começo ou antes do fim. Todas as palavras de seiscentos dias, tanto querendo ser ditas, tanto querendo não ser ditas, pois tão eufóricas, confusas... e tão prontas para expandir-se ruidosamente.
Inseguras palavras... E apenas o que se fez foi um momento. Nada iniciado ou terminado.
Apenas mais uma espera.